A rastreabilidade de resinas recicladas vem ganhando protagonismo na indústria do plástico, impulsionada por exigências regulatórias, inovação tecnológica e a crescente demanda por economia circular. Neste conteúdo, exploramos os avanços, as oportunidades e as soluções que estão moldando esse novo cenário.
O que é rastreabilidade de resinas recicladas?
A rastreabilidade de resinas recicladas é a capacidade de acompanhar todo o ciclo de vida desses materiais — desde a origem dos resíduos até sua transformação em novas matérias-primas e posterior aplicação em produtos finais.
Mais do que um controle de qualidade, essa rastreabilidade garante transparência, segurança jurídica e alinhamento com diretrizes ambientais nacionais e internacionais.
Conceito e importância para a indústria
Para a indústria, esse controle é um divisor de águas. Ele permite não só comprovar o uso de resinas plásticas recicladas, mas também atender às exigências regulatórias que vêm ganhando força em todo o mundo.
A certificação EN 15343, por exemplo, exige comprovações rigorosas sobre a origem e o processamento de plásticos reciclados, sendo cada vez mais valorizada para acesso a mercados internacionais, redução de impostos e comprovação de práticas sustentáveis.
Além de fortalecer a confiança de consumidores e parceiros comerciais, a rastreabilidade de resinas recicladas contribui diretamente para a transição para a economia circular, otimizando o uso de recursos e ampliando a vida útil dos materiais plásticos.
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Contexto da reciclagem de plásticos no Brasil
O Brasil recicla, anualmente, cerca de 1,1 milhão de toneladas de plásticos, com destaque para a reciclagem mecânica de pós-consumo, que atingiu 25,6% em 2022, segundo a Associação Brasileira da Indústria do Plástico — Abiplast.
Os dados mostram um avanço — houve crescimento de 46% no volume reciclado desde 2018 —, mas o potencial ainda é muito maior, considerando que o país gera mais de 7 milhões de toneladas de resíduos plásticos por ano.
Parte do desafio está na logística reversa de plásticos, ainda marcada pela informalidade e pela falta de controle sobre a origem e o destino dos resíduos. A rastreabilidade surge como um passo fundamental para profissionalizar o setor, garantir a integridade da cadeia produtiva e facilitar o acesso das empresas à certificação de sustentabilidade.
A pressão do mercado por comprovações reais e auditáveis de práticas sustentáveis também cresce. Com a criação de plataformas como a Recircula Brasil e soluções de automação na logística reversa, o país começa a dar passos mais sólidos em direção a uma reciclagem de plástico mais transparente, confiável e integrada às políticas públicas, como a Política Nacional de Resíduos Sólidos.
Plataforma Recircula Brasil
A rastreabilidade de resinas recicladas no Brasil ganhou um novo patamar com a criação da Plataforma Recircula Brasil. Desenvolvida pela Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI) e pela Abiplast, essa ferramenta pioneira utiliza tecnologia para monitorar todo o ciclo dos plásticos reciclados desde a geração do resíduo até a sua transformação em novos produtos.
A proposta é garantir mais transparência, eficiência e credibilidade ao processo de reciclagem, estimulando práticas alinhadas à transição para a economia circular.
Reconhecida internacionalmente, a plataforma foi destacada pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente como referência no combate à poluição plástica. Ela também atende às diretrizes da Nova Indústria Brasil (NIB) e da Política Nacional de Resíduos Sólidos, consolidando-se como um eixo estratégico para a indústria brasileira avançar em sustentabilidade.
Como funciona e quem pode participar
A tecnologia usada pela Recircula Brasil conecta automaticamente notas fiscais eletrônicas para rastrear o fluxo de resinas plásticas recicladas. O sistema identifica a origem dos resíduos, o tipo de resina reciclada, o percurso percorrido e a aplicação final. Tudo isso com base em dados auditáveis e integrados em tempo real.
Podem participar recicladoras, transformadoras, indústrias de bens de consumo e qualquer empresa interessada em garantir a rastreabilidade de resinas recicladas. A adesão é simples e abre portas para uma série de benefícios, como certificações ambientais, acesso a incentivos fiscais e qualificação para mercados com exigências mais rígidas de sustentabilidade.
Selos de Rastreabilidade e de Conteúdo Reciclado
A plataforma também oferece dois selos oficiais que agregam valor à cadeia produtiva: o Selo de Rastreabilidade, voltado para empresas recicladoras e transformadoras, e o Selo de Conteúdo Reciclado, destinado às marcas que incorporam resinas recicladas em seus produtos.
Ambos os selos são validados por auditorias independentes e se apoiam nos dados da plataforma para comprovar, de forma transparente, a origem e o destino dos materiais. O processo evita alegações infundadas, inibe o greenwashing e fortalece o compromisso ambiental das empresas junto aos consumidores, órgãos reguladores e parceiros de negócio.
Benefícios para recicladores, transformadores e marcas
Com a adesão ao Recircula Brasil, os diferentes elos da cadeia de reciclagem passam a operar com mais segurança e previsibilidade. Recicladores podem provar a procedência dos materiais e atrair clientes que exigem compliance ambiental. Transformadores garantem acesso a resinas plásticas recicladas com rastreabilidade comprovada e reduzido risco reputacional.
Já as marcas conquistam mais confiança do mercado ao oferecer produtos com selos de sustentabilidade, podendo inclusive atender a futuras regulamentações que devem exigir percentual mínimo de conteúdo reciclado — como o esperado decreto do MMA. Essa rastreabilidade também ajuda a preparar as empresas para certificações internacionais, como a certificação EN 15343, e a atender exigências relacionadas aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU.
A plataforma ainda contribui para o mapeamento e automação da logística reversa de plásticos, fornecendo dados estratégicos para decisões mais sustentáveis e investimentos mais eficazes em toda a cadeia.
Certificações internacionais aplicáveis
À medida que cresce a demanda por práticas sustentáveis, a rastreabilidade de resinas recicladas passa a ser respaldada por certificações internacionais cada vez mais exigidas em diversos mercados. Essas certificações ajudam a padronizar processos, garantir a procedência dos materiais e aumentar a credibilidade de produtos reciclados no cenário global.
Uma das mais relevantes é a certificação EN 15343, voltada para rastreabilidade e verificação do conteúdo reciclado em plásticos. Além disso, auditorias independentes e critérios documentais rigorosos tornam-se ferramentas indispensáveis para comprovar o compromisso ambiental.
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Norma EN 15343 (SGS) e seus requisitos
A EN 15343 é a norma europeia que estabelece os critérios para rastrear e verificar o conteúdo de resinas plásticas recicladas. Seu objetivo é assegurar que o material realmente tenha origem reciclada e que o processo de reciclagem atenda a padrões técnicos e ambientais reconhecidos.
Empresas certificadas com a EN 15343 demonstram conformidade com os procedimentos de rastreabilidade e são reconhecidas por cumprir regulamentos da União Europeia, como as diretrizes sobre plásticos de uso único. A certificação pode ser obtida por meio de organismos credenciados como a SGS, que orientam o processo, avaliam a documentação e auditam os fluxos produtivos.
Além de atender legislações, esse padrão também pode permitir que empresas solicitem reduções de impostos sobre embalagens plásticas e fortaleçam sua reputação como agentes da transição para uma economia circular.
Auditorias independentes e comprovação documental
A confiabilidade da rastreabilidade de resinas recicladas depende diretamente de processos auditáveis. Certificações como a EN 15343 exigem documentação detalhada sobre o ciclo de vida dos materiais, contratos com recicladoras, registros fiscais, laudos técnicos e protocolos de controle de qualidade.
Esses documentos são analisados por auditorias independentes, que validam se o conteúdo reciclado informado nos produtos corresponde à realidade. A presença de um selo ou atestado sem uma verificação externa representa risco de greenwashing, o que torna as auditorias essenciais para garantir transparência e segurança jurídica.
Plataformas como a Recircula Brasil também utilizam esse modelo de verificação técnica baseada em documentos fiscais eletrônicos e cruzamento de dados, promovendo rastreabilidade e autenticidade em larga escala.
Impactos em exportação e exigências globais
Empresas que atuam ou desejam atuar no mercado internacional precisam se adaptar às novas exigências de comprovação ambiental. Países da União Europeia e outras regiões já exigem certificações específicas que confirmem o uso de resinas recicladas com rastreabilidade validada.
A ausência de comprovação pode gerar barreiras comerciais, inviabilizar contratos e afetar a imagem de marcas e fornecedores. Já quem investe em processos auditáveis e adota certificações reconhecidas tem mais facilidade para acessar mercados globais, principalmente os que valorizam a logística reversa de plásticos e a comprovação de sustentabilidade.
No Brasil, o avanço da certificação de sustentabilidade por meio de normas como a EN 15343 e ferramentas como o Recircula Brasil prepara as indústrias para essa nova realidade que é, ao mesmo tempo, regulatória e de posicionamento estratégico.
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Vantagens da rastreabilidade para a indústria
A adoção da rastreabilidade de resinas recicladas vai além do cumprimento de normas. Representa um salto de qualidade nos processos industriais e uma resposta prática às demandas por responsabilidade socioambiental. Com isso, a indústria ganha mais do que certificações: ela conquista confiança, previsibilidade e acesso a novos mercados.
Redução de riscos e greenwashing
Ao adotar sistemas de rastreabilidade, as empresas reduzem significativamente o risco de cair em práticas ou acusações de greenwashing. A comprovação documental, aliada a auditorias técnicas, permite que toda a operação esteja respaldada por dados reais, auditáveis e legalmente reconhecidos.
É uma preocupação especialmente importante em setores como o de bens de consumo, embalagens, cosméticos e alimentos, onde a pressão por responsabilidade ambiental é alta e a reputação da marca pode ser impactada por inconsistências ou exageros em declarações de sustentabilidade.
Transparência na cadeia de valor
A rastreabilidade fortalece a transparência em toda a cadeia de valor, permitindo que cada elo — do reciclador ao consumidor final — tenha acesso às informações sobre origem, composição e destino dos materiais plásticos utilizados.
Essa transparência ajuda a indústria a identificar gargalos, fortalecer relações com fornecedores, garantir estabilidade no suprimento de resinas recicladas e tomar decisões mais assertivas sobre investimento, inovação e posicionamento de mercado.
Com o uso crescente de tecnologias como o blockchain na reciclagem, esse nível de rastreabilidade tende a se tornar ainda mais preciso, seguro e acessível.
Diferenciais competitivos e reputacionais
No cenário atual, adotar a rastreabilidade de resinas recicladas é um diferencial competitivo claro. Empresas que operam com transparência e sustentação documental sólida se destacam frente a consumidores, investidores e parceiros de negócio.
Além disso, esse posicionamento fortalece a reputação corporativa e prepara o terreno para adesão a programas ESG, obtenção de selos de sustentabilidade e captação de recursos voltados a práticas verdes.
Com a rastreabilidade, a indústria não apenas melhora sua performance ambiental — ela demonstra, com provas, que está comprometida com uma produção mais consciente, contribuindo para uma economia circular de verdade.
Tendências e próximos passos
O cenário regulatório e mercadológico para a rastreabilidade de resinas recicladas está em plena transformação. As exigências de comprovação de práticas sustentáveis, antes restritas a nichos ou mercados internacionais, agora se consolidam como tendência irreversível também no Brasil.
As mudanças indicam que as empresas que adotarem sistemas robustos de rastreamento e certificação sairão na frente — tanto em competitividade quanto em conformidade legal.
Exigências regulatórias futuras no Brasil
Uma das mudanças mais recentes que afeta diretamente a cadeia de reciclagem de plástico no Brasil foi a sanção da Lei nº 15.088/2025, que proíbe a importação de resíduos sólidos e rejeitos, incluindo plásticos.
Em vigor desde janeiro de 2025, essa legislação reforça o foco no aproveitamento interno de materiais recicláveis e fortalece o mercado nacional de reciclagem, com impacto direto na logística reversa de plásticos.
A nova regra visa proteger a economia circular brasileira de distorções causadas pela entrada de resíduos de outros países, além de valorizar o trabalho de catadores, recicladores e transformadores locais.
Um decreto publicado em maio de 2025 regulamentou a lei, estabelecendo cotas de exceção controladas e segurança jurídica para a indústria, sem comprometer o abastecimento de matéria-prima reciclada onde necessário.
Paralelamente, cresce a expectativa de regulamentações que estabeleçam metas obrigatórias de uso de conteúdo reciclado em embalagens e produtos. Essa tendência se alinha à Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei 12.305/2010), base legal da logística reversa no país, e ao Decreto 10.936/2022, que define a responsabilidade compartilhada entre fabricantes, distribuidores, comerciantes, consumidores e o poder público.
Com o aumento da fiscalização ambiental e da conscientização sobre os impactos dos microplásticos, a rastreabilidade de resinas recicladas tende a deixar de ser um diferencial para se tornar uma exigência regulatória — necessária para atuar no mercado, garantir a integridade dos processos produtivos e atender a políticas públicas de transição para a economia circular.
Integração com tecnologia (blockchain, IA e automação)
A rastreabilidade de resinas recicladas está passando por uma transformação tecnológica. Ferramentas como blockchain, inteligência artificial e automação estão sendo incorporadas à cadeia da reciclagem para garantir mais controle, segurança e eficiência em cada etapa — da coleta ao reaproveitamento dos materiais.
O blockchain, em especial, vem se destacando como uma solução robusta para assegurar transparência, imutabilidade e responsabilidade compartilhada. A tecnologia permite que todas as transações da cadeia sejam registradas em um sistema descentralizado, resistente a fraudes e acessível a todos os participantes.
Estudos acadêmicos apontam que suas principais características incluem: persistência de dados, rastreabilidade (data provenance), consenso distribuído, controle descentralizado e visibilidade total das operações, favorecendo a logística reversa de plásticos com mais confiabilidade.
Um dos cases mais emblemáticos é o da Plastic Bank, que atua no Brasil e em outros países utilizando blockchain desenvolvido em parceria com a IBM. A plataforma já retirou mais de 170 mil toneladas de plástico do ambiente e pagou R$ 2,5 milhões a catadores brasileiros cadastrados, que recebem bonificações por quilo coletado. Toda a cadeia é digitalizada, permitindo que cada garrafa PET coletada seja rastreada desde a coleta até sua reinserção no ciclo produtivo — já são mais de 350 milhões de unidades coletadas no país.
Outro exemplo é o Programa EmCicla, fruto da parceria entre a ABIOVE e a cleantech Polen. Focado na reciclagem de embalagens de óleos vegetais, o programa passou a usar blockchain a partir de 2023 para registrar, com precisão e segurança, cada etapa da logística reversa. Desde seu início, já foram recicladas mais de 55 mil toneladas, com impacto direto em cooperativas e catadores em todo o Brasil.
A Circular Brain, startup brasileira com sede em Jundiaí (SP), é mais um destaque no uso de tecnologia para a rastreabilidade e a reinserção de resíduos eletroeletrônicos. Sua plataforma conecta fabricantes, recicladores, transportadoras e governos em um ecossistema digital, inteligente e auditável. Em apenas três anos, a empresa já processou mais de 100 mil toneladas de resíduos.
Perspectiva de mercado e oportunidades
O avanço da rastreabilidade de resinas recicladas no Brasil não acontece isoladamente. Ele é impulsionado por um cenário regulatório em evolução e pela crescente demanda global por soluções que reduzam a dependência de plásticos virgens. A promulgação da Lei nº 15.088/2025, que proíbe a importação de resíduos sólidos, é um dos marcos recentes que reposicionam o país nesse contexto.
A nova legislação tem potencial para fortalecer o mercado interno de reciclagem, reduzindo a concorrência desleal com resíduos importados e abrindo espaço para investimentos em inovação, infraestrutura e capacitação de cooperativas. Isso se alinha a tendências globais observadas na União Europeia, onde já se aplicam metas rigorosas de reciclagem de embalagens e restrições severas ao uso de plásticos descartáveis.
O Brasil, por sua vez, começa a trilhar um caminho semelhante. O Projeto de Lei nº 2524/2022, já aprovado pelo Senado, estabelece bases para a economia circular do plástico no país, reconhecendo o papel das cooperativas de catadores como prestadoras de serviços ambientais remunerados. A proposta reforça o valor econômico e social da reciclagem e sinaliza uma nova fase de amadurecimento do setor.
Esse novo ambiente regulatório, somado à pressão da Agenda 2030 e ao crescimento da reciclagem de plástico no Brasil — que já ultrapassou 1,1 milhão de toneladas por ano —, cria oportunidades concretas para empresas que investem em rastreabilidade, certificação de sustentabilidade e inovação tecnológica.
Com o fim da importação de resíduos, a tendência é que haja maior valorização da matéria-prima reciclada nacional e um estímulo direto ao desenvolvimento de produtos mais circulares. Isso inclui desde embalagens compostáveis e retornáveis até sistemas de produção que integrem, desde a origem, estratégias claras de reaproveitamento e rastreamento de insumos.
O momento é favorável para quem deseja se posicionar como agente da transformação: empresas, recicladores e marcas que atuarem com transparência, dados auditáveis e compromisso com a economia circular estarão à frente em um mercado que já começa a exigir mais do que intenções — exige comprovação.
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